A novilíngua de Correia de Campos
O ministro da Saúde desvalorizou ontem a existência de mais de 208 mil doentes em lista de espera, 40 mil dos quais há mais de um ano, lembrando que estão menos 20 mil pessoas à espera de uma operação do que há seis meses. No que já vem sendo um hábito neste governo, Correia de Campos trabalha os números da forma que melhor lhe convém. Estranhamento, ninguém na imprensa se deu ao trabalho de ir comparar os números, não com os últimos seis meses apresentados pelo Governo, mas com o que existia quando o ministro tomou posse. Se o tivessem feito, e era bem simples, teriam reparado que há dois anos existiam 224 mil doentes em lista de espera. Compreende-se que o ministro omita esse dado. É bem diferente dizer que se reduziu em 10% as listas de espera nos últimos seis meses, do que dizer que se precisou de mais de dois anos para alcançar esse número. Em dois anos e meio o governo diminui as listas de espera de 224 mil para 208 mil doentes e, todo contente, diz que são “valores que não nos envergonham”. Talvez não envergonhe o ministro, mas temo que a mesma opinião não possa ser subscrita pelos 20 mil doentes em lista de espera há mais de dois anos ou pelos doentes que esperam mais de um ano para serem operados ao cancro.
Mas o cuidado em ocultar a realidade, apresentando-a com cores mais suaves, não se fica por aqui. Disse o ministro que “chegámos ao Governo com oito meses e meio de tempo mediano de espera e estamos neste momento com cinco meses”, no que foi tomado, pela quase totalidade da imprensa, como o tempo médio que cada doente espera para ser operado. Mas o ministro, cuidadoso, nunca falou em tempo médio de espera, mas sim de “tempo mediano” o que, parecendo a mesma coisa, está a léguas de o ser. A mediana é uma operação estatística que calcula o valor mais provável. Com esta regra, os tais 20 mil doentes que estão à espera há mais de dois anos foram, quase de certeza, omitidos nos cálculos de Correia de Campos.
Deixo apenas um exemplo, para se ver como as coisas são diferentes.Em Março deste ano, o Ministério da Saúde publicou um estudo sobre as listas de espera nas doenças oncológicas. O tempo médio de espera, no país, era de 105 dias, ou seja, três meses e meio. Mas, de acordo com a “mediana” traçada pelo Governo, os 105 dias passaram a 44. Um mês e meio, sendo esse o número que foi o que foi divulgado pelo Governo. Depois da forma engenhosa como Sócrates tentou esconder a sua promessa de criação de 150 mil empregos, os constantes truques utilizados por Correia de Campos começam a indicar um padrão preocupante sobre a forma como o governo martela os números para esconder os seus principais falhanços.
4 comments:
padrão preocupante também de como os jornalistas não fazem o seu trabalhinho de casa...para quê fazer as contas?
O grande drama é que os jornalistas nada sabem de contas!
Assumidamente, não existe um problema com a matemática?
E voces ainda nao os viram a deitar agua no vinho e a meter o dedo na balança...
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