16 outubro, 2007

A nova constituição explicada às criancinhas

A intelegentsia liberal reencontrou-se com Luís Filipe Menezes e o PSD. O insuportável populista de sexta-feira passou, quatros dias passados, a ser o líder que tem a lucidez de apontar o dedo à constituição, esse texto “programático” que viola “um dos princípios básicos da democracia liberal”.

Para quem não percebeu, à primeira, o que é que Menezes queria defender com propostas como ”separar a medicina pública da privada”, José Manuel Fernandes dedicou o seu editorial de hoje para explicar a matéria às criancinhas. Dos três anacronismos constitucionais que escolheu, dois são sobre a progressiva gratuitidade do serviço nacional de saúde e educação e o último sobre o direito das comissões de trabalhadores a intervirem na gestão das empresas (uma matéria que, como se sabe, só acontece em paraísos socialistas e economicamente atrasados, como a Alemanha, onde as comissões de trabalhadores têm lugar –imposto por lei – nos conselhos de administração).

“Uma constituição deve ser sobre os meios de governo, não sobre os fins do Governo”, diz José Manuel Fernandes escassos parágrafos antes de defender que uma nova constituição ”limite os défices públicos a todos os níveis”. Afinal, parece que o problema da constituição não é ser programática, é que o programa não é do agrado de José Manuel Fernandes.

Quis o acaso que, no mesmo dia em que Pacheco Pereira e JMF decidiram elogiar uma nova constituição que abra caminho ao fim da universalidade dos sistemas de educação e saúde, a Federação dos Bancos Alimentares contra a Fome tenha alertado para o crescimento da pobreza no nosso país e para o aparecimento de um novo fenómeno de pobreza, atingindo milhões de pessoas que, trabalhando, não conseguem viver sem os apoios estatais. No país mais pobre e com as maiores diferenças de rendimentos entre ricos e pobre da Europa, a solução milagrosa dos liberais é acabar com a (quase) gratuitidade dos principais serviços sociais. Está certo...

É a única forma de pormos um ponto final nas “mentiras piedosas” que têm evitado um maior “caos orçamental e económico”. Aqui, sou forçado a concordar com o director do “Público”. Se há alguém que pode falar de “cátedra” sobre caos económico é o director e administrador de um jornal que, sob a sua liderança, não pára de “perder” jornalistas, leitores e acumula resultados negativos todos os anos.

3 comments:

Anónimo disse...

...contudo, não deixam de ser ideias que se encaixam muito bem no perfil de governação do actual governo pelo que deverão ser aproveitadas pelo PS para esvaziar ainda mais de forma e conteúdo o actual PSD. Com o PS na sua forma natural de partido liberal uma constituição nova com essas ideias seria uma benção. Benção essa que é fácil de adivinhar numa próxima revisão constitucional.

Anónimo disse...

Penso que os apoios estatais para ajudar quem mesmo trabalhando não consegue sobreviver são formas que a longo prazo perpetuam o actual estado de coisas, ou até o pioram. As empresas permitem-se pagar ordenados escandalosamente baixos porque existe a possibilidade de as pessoas recorrerem a apoios estatais.
Não seria mais lógico subir o ordenado mínimo para 600 ou 700 euros? Se os empresários se conseguem adaptar à subida dos preços dos combustíveis, das matérias primas, etc, podem perfeitamente adaptar-se também à subidas dos custos "humanos" de produção.
Quanto à gratuitidade dos serviços público, penso que esta deve continuar universal e não limitada às classes mais desfavorecidas, como parece ser a tendência dominante no discurso político. Nunca esperei ver "direitos sociais" transformarem-se em "caridade pública".

joãoeduardoseverino disse...

Parabéns Pedro Sales. O que escreveu merece o meu aplauso porque ninguém tem a coragem de escrever a verdade do que se passa no Público. Era leitor desde o primeiro número, mas quando JMF e o seu patrão despediram, de uma assentada, 50 jornalistas, nunca mais olhei para o jornal.