04 janeiro, 2008

O espectáculo do ano já começou


Esperança e mudança. Fartos e cansados da política do medo seguida pelo sistema político de Washington durante a administração Bush, as palavras mais usadas por Obama no seu impressionante discurso de vitória no Iowa arriscam-se a ser o eixo da campanha presidencial norte americana. Não por acaso, Hillary e Giuliani, os dois candidatos mais conotados com o "sistema", foram os grandes derrotados de ontem. O problema de Hillary não foi tanto ter perdido para Obama, mas ter ficado atrás de John Edwards. Permite a este criar o momento que o legitima como um potencial candidato ganhador e que lhe permite continuar a recolher dinheiro para o manter na corrida. Ontem teve um excelente discurso, bem longe do fulgor retórico e oratório de Obama, mas provando que é o candidato mais à esquerda no campo democrata.
O João Rodrigues e o Nuno Teles já tinham chamado a atenção para as suas propostas - principalmente o plano de saúde e a retirada do Iraque - e para o apoio que tem recolhido entre os economistas de esquerda. Ontem voltou a falar de um dos temas que tem destacado nas últimas semana, criticando a "corporate greed" que tem conduzido ao aumento da desigualdade social nos EUA. Edwards pode ser a surpresa no campo democrata, afirmando-se definitivamente como um nome a ter em conta. Ainda bem. Obama parece cada vez mais ser aquilo que tanto critica nas suas intervenções, dizendo aquilo que as pessoas (e os seus financiadores) querem ouvir.

PS: Com um correspondente especial nos EUA a tempo inteiro, e um intermitentente entre Angola e Chicago, o Zero de Conduta vai acompanhar as eleições com especial atenção. Na barra da direita, já se pode encontrar o link para todos os textos sobre a Indecisão 2008. Serão muitos.

5 comments:

pg disse...

A derrocada do discurso republicano?
O terceiro lugar de Hillary Clinton(HC)é uma pequena sensaçao. É duvidoso que os americanos elejam alguém com um nome tao parecido com o mais odiado terrorista do mundo, mas por que razao teve HC tao mau resultado? Talvez seja esta a questao que interessará à(s) esquerda(s) reflectir. "Change" foi a palavra mais importante das últimas semanas nos EUA. DE acordo com uma sondagen de uma cadeia de TV 2/3 dos americanos querem uma mudança na política. Pensam que o seu país nao está no bom caminho. A insatisfaçao tem as suas razoes: Bush deixa uma herança catastrófica. O Iraque tornou-se num pesadelo e agora surgiu uma desastrosa crise imobiliária e de crédito. Ela ameaça a existência de milhoes de americanos. Economicamente os EUA encontram-se no início de uma recessao. Os preços da energia e dos bens essenciais aumentam. Esta dinâmica negativa tornou-se no principal tema das últimas semanas, mais do que a guerra no Iraque. Contudo, a exigência de uma mudança nao é novidade. Faz parte da retórica política clássica. Também os temas eleitorais, exceptuando o da mudança de clima, pouco se alteraram. Os democratas exigem, desde há muito, um seguro de saúde para todos os americanos. Também pouca novidade tem a crítica ao aumento drástico da desiguldade nos últimos decénios. Os democratas tinham um único problema: perderam, com estes temas, as eleiçoes nos últimos 40 anos. Os Republicanos determinaram o discurso político, com uma mistura de radicalismo de mercado e valores conservadores. Com a sua retórica atingiram a maioria dos eleitores, para além da poderosa direita religiosa. O mais tardar com a eleiçao de Reagan, em 1980,operou-se a ruptura com a tradiçao do Presidente democrata Roosevelt:a questao do papel do Estado. Com Roosevelt ainda considerado a soluçao para os problemas económicos e sociais, tornou-se com Reagan NO problema. Regan prometeu resolvê-lo. Os democratas tornaram-se assim incapazes de conquistar maiorias estruturais. Só com Clinton é que isto se alterou. Ele fez compromissos com o Zeitgeist republicano. Foi a única forma que encontrou para alcançar a vitória´. Os EUA, na era Clinton, tiveram êxito economicamente, mas este êxito baseou-se principalmente na dinâmica da indústria financeira da Wall Street e esta encontra-se hoje na sua maior crise desde 1929. Mas o mais importante é que Clinton nao conseguiu fazer a reforma da segurança social, nem alterar a crescentre desigualdade. Os temas clássicos dos democratas ficaram pelo caminho. A agenda política continuou a ser determinada pelos republicanos. Um democrata em Washington também nao alterou esta realidade. Parece ser esta a realidade que terminou. As coordenadas políticas deslocaram-se. A mudança documenta a derrocada do discurso republicano que o economista, próximo dos democratas, Paul Krugman reduziu a três pontos: baixa de impostos, mercado livre, e uma ortodoxia da avidez. A crise económica e social desacreditou esta ideologia e os americanos já nao acreditam nas consequências positivas do radicalismo de mercado. Em seu lugar apareceu o medo da descida económica e social. Este medo atinge principalmente a classe média. Por isso os candidatos republicanos falam da mudança e do medo da classe média, mas encontram-se ideologicamente num beco, já que é impossível um afastamento da ideologia de mercado e encontram-se sob a pressao da direita religiosa que sempre representou uma minoria dos americanos. A fraqueza dos republicanos é, assim, fácil de explicar, mas de repente HC também parece peretencer ao passado, nao só porque só conseguiu uma clara maioria nos eleitores com mais de 65 anos, tendo ficado até em minoria no voto das mulheres. Barak Obama nao ganhou só no grupo dos 45 anos. A verdadeira sensaçao é a sua vitória nos eleitores sem partido político. A sua retórica sobre a mudança desenvolveu uma enorme dinâmica para além no campo democrata. HC tornou-se assim vítima dos seus compromissos no passado. Nao quis dar argumentos aos republicanos e apoiou a guerra no Iraque. Agora é identificada com esta política e parece um modelo ultrapassado. A vitória de Obama em Yowa tem consequências profundas. Significa a derrota de uma política que reduziu a influência do Estado em favor do mercado. O que isto significa concretamente hoje ainda nao é possível saber, mas uma coisa é certa esta mudança será sentida mundialmente. Também na Uniao Europeia. Enquanto por cá ainda se discute a agenda neo-liberal, nos EUA faz-se História.

Olaio disse...

É enternecedor ver a forma como os socias-democratas acreditam que há diferenças entre os "democratas" e os "republicanos" americanos e deliram com estes espectáculos da "democracia" tipo comercial.

É claro que há umas diferenças, porque são duas das principais tendências do "partido único americano" embora as diferenças entre a esquerda e a direita, dependam dos dias e do lado para que sopra o vento, como se pode ver pelo seguinte trecho, sacado do blog "um homem das cidades":

Leslie Stahl no programa da CBS – 60 Minutos em 5/12/1996, a entrevistar a Secretária de Estado Medeleine Albright (dos democratas) sobre as sanções impostas pelos Estado Unidos ao Iraque:

Leslie Stahl: "Soubemos que meio milhão de crianças morreram, quero dizer, são mais crianças do que as que morreram em Hiroxima. E, bom, acha que este preço valeu a pena?"

Madeleine Albright: "Penso que é uma escolha difícil de fazer, mas o preço – achamos que o preço valeu a pena."

José M. Sousa disse...

Propostas de Obama e Hillary Clinton relativas à política energética e de combate às alterações climáticas

http://climateprogress.org/2008/01/04/desmogblog-owes-obama-three-apologies/

http://climateprogress.org/2007/10/09/obamas-excellent-energy-and-climate-plan/

http://climateprogress.org/2007/11/05/clinton%e2%80%99s-outstanding-energy-and-climate-plan/

Anónimo disse...

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